Prontuário e responsabilidade profissional
O crescente número de demandas judiciais contra médicos e demais profissionais e instituições de saúde, decorrente do maior acesso à justiça e aos procedimentos na área da saúde, exige dos profissionais envolvidos um conhecimento aprofundado das várias questões que permeiam o exercício de seu ofício, as quais abrangem desde o aprendizado dos instrumentos preventivos até os meios para a solução dos conflitos já estabelecidos.
Para tanto, tais profissionais devem conhecer pormenorizadamente e cumprir a legislação pertinente à sua área de atuação, identificar os principais erros e suas implicações jurídicas, bem como analisar situações de risco, de modo a prevenir-se de eventuais responsabilizações.
Diante disso, um dos instrumentos disponíveis para garantir a regularidade da atuação do profissional da saúde e evitar sua responsabilização, comum a todas as profissões do ramo, é o registro das informações do paciente por meio do Prontuário, assim entendido como o acervo documental padronizado, organizado, conciso e sigiloso referente ao registro dos cuidados prestados ao paciente por todos os profissionais envolvidos na assistência à saúde.
Tal documento possui diversas finalidades, dentre as quais se destaca a comunicação entre a equipe de saúde, sendo um importante instrumento legal de prova do ato do profissional da saúde, uma vez que possibilita o fornecimento de informações a respeito do tratamento realizado à pessoa assistida. Também se presta como prova administrativa e financeira de realização do serviço como base para a apuração dos gastos e consequente elaboração do faturamento, bem pela utilidade ao ensino, pesquisas, auditorias, processos jurídicos, planejamento,fins estatísticos e outros.
Entretanto, para serem consideradas autênticas e válidas deverão as ações registradas no prontuário do paciente, estar legalmente constituídas, ou seja, possuir assinatura do autor do registro e inexistir rasura, entrelinhas, emenda, borrão ou cancelamento, características que poderão gerar a desconsideração jurídica do documento produzido como prova documental. Salienta-se que as declarações constantes do documento particular, escrito e assinado, presumem-se verdadeiras em relação a quem o assinou, fator importante na defesa do profissional em processos judiciais e éticos.
A ausência dos registros, ou se realizados de forma incompleta, pode indicar má qualidade da assistência do profissional ou da instituição de saúde e ensejar a responsabilidade sobre seus atos profissionais no âmbito ético, administrativo, cível e criminal.
O Ministério da Saúde, por meio da Portaria MS n. 1.820/2009 – Carta dos Direitos dos Usuários da Saúde- preconiza, como direito, o acesso a qualquer momento, do paciente ou terceiro por ele autorizado, a seu prontuário e aos dados nele registrados, bem como a garantia do encaminhamento de cópia a outra unidade de saúde, em caso de transferência. Dispõe, ainda, sobre as informações que devem constar do documento, como o motivo do atendimento e/ou internação, dados de observação clínica, evolução clínica, prescrição terapêutica, avaliações da equipe, dentre outros.
Além das legislações afetas a cada profissão, os Conselhos Profissionais regulamentam a matéria por meio de atos normativos próprios, cabendo ao profissional se informar sobre a matéria, seja diretamente no seu Conselho, seja por meio de assessoria jurídica especializada, de modo a garantir a plena observância da legislação, prevenindo-se de riscos.
O Prontuário pode ser realizado de forma manuscrita ou eletrônica, sendo que o primeiro, segundo o Conselho Federal de Medicina, apresenta diversas limitações, diante da ineficiência decorrente do armazenamento e organização de grande volume de dados, caracterizando informação disponível somente a um profissional ao mesmo tempo. Também, possui baixa mobilidade e esta sujeito a ilegibilidade, ambiguidade, perda frequente da informação, multiplicidade de pastas, dificuldade de pesquisa coletiva, falta de padronização, dificuldade de acesso, fragilidade do papel, além de sua guarda requerer amplos espaços nos serviços de arquivamento.
Por outro lado, o Prontuário Eletrônico do Paciente- PES, por sua disponibilidade em sistema informatizado, apresenta-se como meio eficaz de compartilhamento de informações do paciente. De acordo com o Conselho Federal de Medicina, vários estudos ao redor do mundo têm demonstrado o impacto positivo sobre a saúde que a implementação de um Prontuário Eletrônico do Paciente pode trazer, tanto para os profissionais de saúde, como para os pacientes, gestores e toda a equipe envolvida na Atenção à Saúde.
Independente se o Prontuário será eletrônico ou manual, à luz da legislação pátria, as informações nele registradas devem ser precisas, concisas, eficazes, atualizadas, organizadas e confidenciais, sendo imprescindível que os profissionais da saúde conheçam todos os instrumentos previstos na legislação correlata que se prestem a cumprir procedimentos obrigatórios e a prevenir riscos, possibilitando o exercício de sua atividade com segurança e qualidade, imbuídos no espírito de prestar o melhor atendimento ao paciente.
Daniela Nogueira